Estimular a leitura através de relações afetivas
“Formação de leitores: a dimensão afetiva na
mediação da família”
AUTOR: Isabela
Ramalho Orlando e Sérgio Antônio da Silva Leite
INTRODUÇÃO
O estudo tem como objetivo
descrever e analisar a dimensão afetiva nas situações de mediação entre o
sujeito e as práticas de leitura literária, enfatizando os processos de
mediação ocorridos no ambiente familiar. Parte da premissa que a mediação
realizada pela família poderá ser um fator fundante para a constituição do
indivíduo como leitor autônomo.
AFETIVIDADE
A afetividade é um conceito
amplo, ocorre por meio da apropriação da cultura pelo indivíduo, principalmente
através das relações interpessoais; são as trocas e construções estabelecidas
na interação com o “outro” que permitem ao indivíduo caracterizar- -se como um
sujeito único, com base na construção de um universo simbólico pessoal.
Vygotsky (1998) considera que
o indivíduo se apropria dos elementos da cultura através das interações sociais
e que sua relação com o mundo ocorre por meio da intervenção de sistemas simbólicos,
sendo que a fala desempenha um papel fundamental nesse processo, quando se
interioriza e passa a constituir o pensamento verbal.
O autor se baseia nos
conceitos elaborados por Wallon, que diferencia os conceitos de afetividade e
de emoção: afetividade refere-se a um conjunto amplo de manifestações que
envolvem emoções (origem biológica) e sentimentos (origem psicológica);
desenvolve-se através da apropriação dos sistemas simbólicos culturais.
As relações que se estabelecem
entre sujeito e objeto são também afetivas, ou seja, não se reduzem apenas à
dimensão cognitiva. Portanto, tais relações provocam, no sujeito, impactos
afetivos internos e subjetivos, positivos ou negativos, dependendo da qualidade
da relação vivenciada.
LEITURA
A leitura literária é uma
prática cultural que pode ser considerada fundamental para a plena inserção do
indivíduo na sociedade, uma vez que lhe possibilita acesso aos bens culturais,
aprimoramento de sua condição pessoal e de sua compreensão da realidade para
nela intervir (Grotta, 2000).
busca mapear os costumes e as
práticas de leitura, levando em consideração a relação do leitor com sua
comunidade e seu momento histórico.
Expressa o pensamento de que
as ideias descritas por Freire, Chartier, Petit e Certeau, permitem a percepção
de que a leitura possibilita ao sujeito dialogar com as ideias do autor e,
assim, revisar e aprimorar suas ideias e valores, ampliando seu universo
pessoal. Pode-se supor que tais processos estão fortemente presentes no caso da
leitura literária.
RESULTADOS
Nesta pesquisa, os Núcleos
Temáticos indicam os aspectos relacionados às dimensões afetivas identificadas
nas experiências de leitura literária relatadas pelos sujeitos, com ênfase no
ambiente familiar. A etapa final da organização desses dados, realizada
exclusivamente pelos pesquisadores, foi a construção de uma matriz única, a
partir das matrizes com as falas dos três sujeitos, respectivamente. Essa
matriz final aborda os seguintes Núcleos Temáticos, comuns no processo de
constituição de leitor dos três sujeitos: Vivências de leitura; Práticas de
leitura na escola; Papel da Família; Papel dos Amigos; O Namorado; Acesso aos
livros; O impacto da leitura.
MEDIAÇÃO DA FAMÍLIA
Os relatos dos três sujeitos
mostram que os familiares foram mediadores de grande impacto. A contação de
histórias na infância, geralmente realizada pela mãe ou pelo pai, é carregada
de marcas afetivas positivas e são as primeiras lembranças dos sujeitos em
relação à leitura.
Os sujeitos relatam que, ao
longo de suas vidas, tiveram suporte dos familiares que garantiu o acesso aos
livros. Esse suporte se deu de diversas formas: empréstimo de livros de
coleções particulares; compra de livros e gibis, muitas vezes em sebos, por
terem preços mais acessíveis; visitas a feiras de livros. Eles ressaltam que,
desde a infância, tinham acesso aos livros que havia em suas casas, além de
permissão para manuseá-los e lê-los. Essa facilidade foi, do ponto de vista dos
sujeitos, determinante para que estabelecessem vínculos positivos com esse
material.
OUTROS MEDIADORES IDENTIFICADOS
As práticas de leitura na
escola tiveram diferentes impactos ao longo da vida dos sujeitos: muitas vezes
o material lido era considerado desinteressante pelos sujeitos ou eles
desmotivavam-se em razão das atividades avaliativas propostas.
Pode-se observar, nos três
relatos, a influência que o professor de literatura do Ensino Médio exerceu na
constituição dos sujeitos como leitores autônomos. Seus professores de
literatura foram responsáveis por guiar a transição da adolescência para a vida
adulta, e orientar os sujeitos.
DISCUSSÃO
A autora buscou investigar o processo
de constituição do leitor literário, destacando o papel da família nesse
processo e tendo como base os estudos acerca do desenvolvimento humano de
Wallon e Vygotsky.
Cada um dos participantes da pesquisa
trouxe uma história singular de envolvimento com a leitura. No entanto, foi
possível agrupar aspectos comuns do processo de formação de leitor desses
sujeitos, especialmente sobre a mediação realizada pelos familiares, e, dessa
maneira, foi possível elaborar considerações sobre a importância dos conteúdos
afetivos das mediações vivenciadas pelo sujeito para sua constituição como
leitor autônomo.
O movimento de aproximação
desses sujeitos com as práticas sociais de leitura foi, certamente, determinado
por esses conteúdos afetivos positivos, presentes em cada mediação descrita por
eles.
A afetividade desenvolve-se ao
longo da vida, sendo que esse processo está relacionado às conquistas no plano
cognitivo; ao mesmo tempo, o desenvolvimento cognitivo depende dos vínculos
afetivos. A aquisição de novas estratégias de comunicação permite formas mais
complexas de manifestações afetivas, como o diálogo, o respeito e a atenção
Vygotsky (1998) destaca que,
através da imitação, as crianças podem executar ações que estão além de suas
capacidades, de modo que imitar configura-se como parte importante do processo
de desenvolvimento do sujeito. Portanto, mesmo ações que não eram dirigidas aos
sujeitos, como a rotina e hábitos de leitura dos pais, influenciaram, ainda que
de forma indireta, na relação que os sujeitos estabeleceram com a leitura
literária.
Segundo Wallon (2002/2007), no
desenvolvimento humano, cognição e afetividade são complementares. O relato
descrito no parágrafo anterior exemplifica essa complementaridade entre
cognição e afetividade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No ambiente familiar, os
sujeitos iniciaram seu contato não só com a prática da leitura, mas também com
a leitura do mundo. Assim, durante a infância, os familiares foram os
principais responsáveis por mediar o contato entre o sujeito e a cultura e foi
nesse período que os sujeitos vivenciaram suas primeiras experiências de
leitura, as quais imprimiram fortes impactos afetivos nas relações que se
estabeleceram entre eles e esta prática cultural.
Os conteúdos afetivos dessas
experiências, tais como proximidade física, carinho, atenção, prazer e
respeito, são internalizados e associados à prática da leitura.
Em síntese, defende-se que a
constituição do sujeito como leitor é um processo socialmente construído,
determinado pela história concreta de mediações vivenciadas por ele, nos
diversos ambientes, onde se desataca o da família, que pode representar uma
instância de enorme poder formativo (Leite, 2011).
Aponta que novos estudos devem
ser realizados, buscando-se detalhar os processos de mediação vivenciados por
leitores autônomos, não só na família, mas nas demais instâncias sociais.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ORLANDO IR, LEITE SAS. Formação
de leitores: a dimensão afetiva na mediação da família. Psicol. Esc. Educ.
vol.22 no.3 Maringá Set/Dez de 2018. Disponível em:
Acesso em: 22/09/2019 .
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